sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

TIÃO MAIS CONCEIÇÃO

Texto de Cyntia Pinheiro.

(Este é mais um textinho que fiz para teatro, fez teeeeeeeeeeeeempo, foi em 1996 quando vim morar em Montes Claros, tinha 18 aninhos, foi apresentado na faculdade com adaptações e também no Forró do Lorenzo do Conservatório há uns três anos) Divirtam-se:
 


NARRADOR:  

Boa noite, boa tarde, bom dia!
Vô lhes contá um causo
Que assucedeu outro dia.
 
Era uma veiz uma famia
Lá das banda do nordeste
Tinha uma mãe muito pia
E o pai era um cabra da peste.

A fia, uma moça prendada,
Mas era feia, muito arrasada.
Cunheceu um rapaiz
E logo ficô arriada

Um dia o cabra sumiu
E deu uma sardade danada,
Mas quando o coitado vortô
A festa já tava arrumada.

Fugí era um pôco arriscoso
A mode que o pai era pirigoso
E o danado do noivo,
já tinha feito o gostoso.

A noiva prenha e desonrada
A famia intêra aprumada
O padre já na ispera
E o noivo naquela quimera!

Com um "resolve" no lombo
E a dama segurando o pombo
O jeito foi casá.

Ah! Mais a festa foi boa,
O forró nóis dancemo
O quentão nóis bebemo
E o noivo nem tá mais sofreno

Ocêis tinha que tá lá prá vê
A noiva já embuxada
E o noivo sem bem-querê.
Essa é a história que nóis vai contá procê.

 
CENÁRIO: O NOIVO NA PLANTAÇÃO, ENTRA A NOIVA E FICA A RONDAR...


NOIVO:

Ochente, quem é ocê
Que véve a me arrudiá
Parece que qué me vê
O intão qué me falá.

NOIVA:

Né só vê que quero não
Quero sabê o seu nome
O meu é Conceição.

NOIVO:

Eu chamo é Tião
Se ocê é Conceição
Nóis pode namorá intão

NOIVA:

Vixe! Que avexamento!
É agora que eu to quereno
Cum dé fé o derradêro
Vai sê nosso casamento.

NOIVO:

Casá eu num caso não
Só quero mermo é bejá
Ê trem danado de bão
Coisa mió num há.

NOIVA:

Tá acertado intão,
Tião mais Conceição,
Mais agora vou-me já
Senão meu pai vai lhe capá.

NOIVO:

Se me capa tá danado
Mais dê cá meu isperado
Quero bejá ocê
Pra valê o contratado.

NOIVA:

Já sei que ocê tá quereno
É se apruveitá de mim
Num bejo, num bejo, num bejo
Dispois nóis namora um tiquim.


NUMA OUTRA CENA ESTÁ O PAI E A MÃE DE CONCEIÇÃO, ELA CHEGA

 

CONCEIÇÃO:

Ocêis num sabe o que eu achei
No meio da prantação
Um cabra da muléstia
Que arruinô meu coração.

MÃE:

Escute essa maravia
Ela disincaiô
Homi, é sua fia
Que um noivo arrumô!

PAI:

Vamo marcá o casório
Que se o cabra oiá de perto
Vai vê que tá no purgatório
E aí num dá mais certo.

MÃE:

Fia ocê tem que cuá
O chá de mixirica
No imborná de sá
Deixá o cabra tiririca.

CONCEIÇÃO:

Peraí mãinha,
Casá ele num qué não
Inda mais quando ele vê
Que eu sou um canhão.

MÃE:

Num indianta mermo
Ocê me dá sarstifação
Se ocê faiz a simpatia
Pega bem no coração.

PAI:

Quero vê ele num casá
Quando vê minha coleção (MOSTRA AS ARMAS)
A famia vai chegá
E quero padrinho de montão.

 


NARRADOR:

Meus cumpadi ocêis num sabe
É dispois disso tudo
O que Conceição feiz
Cum seu noivo barrigudo.

CONCEIÇÃO:

Tião, nóis ficô noivo
Que casá nóis vai tê.
Meu pai tá incunvidando o povo
Mermo sem ti cunhecê.

TIÃO:

Nóis ainda nem bejô
E eu falei que num casava
Vem aqui meu amô
Pra nóis dá uma apruveitada.

CONCEIÇÃO:

Só vô se ocê falá
Que cumigo qué casá.

 
TIÃO:

Intonce ocê vem
Que dispois nóis cunversa
Pois olhe aqui meu bem
Que hoje eu tô cum pressa.

 
NARRADOR:

Mais Tião ingambeladô
Muita moça já inganô
E dispois de apruveitá
Conceição ele dexô.

Viajô por muitos dia
E num quis aparecê.
Só que ele num sabia
Que também ia sofrê.

O véio pai da moça
Num agüentava mais
Foi buscá o sem vergonha
Pra vê se tinha paz.

Todo mundo quiria sabê
O que ia acontecê
O povo quiria a festa
Que o véi jurô fazê.

Quando suverteu no mundo
Por 4 mêis e 9 dia
Dexô Conceição chorano
Da sardade que sintia

Vortô cum uma arma nas costa
E o povo a isperá.
Conceição com a barriga
Num dava nem pra disfarçá.

O padre preguiçoso
Acordô cedo esse dia
E o povo sem demora
Foi vê a chegada da famia.

Os padrim era Julieta e Manel
Que dero de presente um pouco de sarapatel
Era também Marieta e Serafim
Que truxeram um colchão
todo feito de capim

Zuleica e Abelardo
Truxero só o mal-olhado
Num gostavam do noivo
Que já tava incabulado

Veio também os pai do noivo
Seu Hermilino, num é minino
E Dona Fernergunda, num é corcunda,
Só truxero raiva e insastifação
Pois a noiva feiz o chá só pra sigurá Tião.

De agora indiante é assustadô
Oceis num sabe o vexame que o noivo passô
Como num quiria entrá, o véio apertô.

 
NOIVO:

Eu num quero casá
Cum essa muié banguela
Por isso num vô entrá
Nem vô abrí a cancela.

PAI:

Entra disinfeliz
Senão ocê vai vê
Três furo nesse nariz
Meu RESOLVE vai fazê.

NARRADOR:

O noivo tentou ir embora
Mas num dava pra correr agora
Oiô pra noiva Conceição
Vixe! Pió que assombração!
E o cabelo ruim
Mermo que vê um aramão.

PADRE:

Tião, ocê é um moço
Que trabaia pra vivê
Entrô nesse sufoco
Quê que nóis pode fazê?

TIÃO:

Olhe seu padre
Casá eu num quero não
Essa muié é muito feia
Inté parece assombração.

JULIETA:

É, na hora de fazê o gostoso
Botô um trabissêro na cara
Agora fica o bustiquento aí
Enrolado a pobre desonrada.

MANEL:

É mermo seu padre
Disincaia essa muié
Pois nóis qué dançá forró
E cumê muito paste.

PADRE:

Intonce nóis já vamo rompê
Mais Conceição ocê sabe
Esse homi num qué ocê.
 
CONCEIÇÃO:

Eu sei seu padre
Isso num é novidade
Mas nenhum qué
Essa é a verdade.

PADRE:

Seu Tião, o sinhô aceita
Entrá na forca e casá cum Conceição?

TIÃO:

E tem jeito de falá não
Cum o pai dela nas costa
Sigurando um revolvão?

PADRE:

Conceição, ocê que é incaiada
Qué casá cum Tião?

CONCEIÇÃO:

Num tem jeito,
Eu quero sim
Pois num vô achá ôtro
cum corage de oiá pra mim.

ZULEICA:

Ande logo seu padre
Que o quentão vai isfriá.

ABELARDO:

Indianta esse negóço
Pru forró nóis cumeçá.

MARIETA:

Ahhhhhh! (CHORANDO)
Discurpa, mais eu chego emocioná,
Um rapais inté bunito
Minha afiada vai sigurá.

SERAFIM:

Cala a boca muié
Num interrompe o sirviço
Casô a mode que ta prenha
E nóis num tem nada cum isso.

MÃE DO TIÂO:

O meu fio esse rapaiz
Nem apruveitô da vida
Agora ta casano
Cum essa desenxabida.

 
PAI DA CONCEIÇÃO:

                                Minha fia é prendada
E é moça direita
Só é um pôco arrasada
Mais inda vai sê prefeita.

PADRE:

Cala a boca por favô
Que eu priciso terminá
Esse casamento da muléstia
Para a festa cumeçá.
Se o noivo tive corage
A noiva pode bejá.

NOIVO:

Corage num tenho não
E num vô nem tentá
Pode ligá o são
Pru forró nóis cumeçá.

NARRADOR:

Ocêis num sabe que tristeza
Acabô assucedendo
Enquanto o povo dançava
A noiva ali sofreno
Tião foi bem dançá
Com as moça que tava lá
Nem viu Conceição
Que se pôs a chorá.
Só que essa tristeza
Inda vai sê maió
Quando ela dé pru fé
Ô dó!
No meio do rasta pé
Foi que Tião armô
Fugiu com a madrinha
Que a todo mundo inganô
Fingindo num gostá do noivo
Zuleica de Abelardo
Ingambelô o povo
Que ficô todo avexado!
No fim do forrozão
Foi que veio a tristeza
Na maió disilusão
Abelardo e Conceição
Sobraro que foi uma beleza!
Sem marido e sem muié
Cum a raiva lá dentro
Avisaro pro veio
Que ficô ferveno.
Cum a arma na cinta
Ocêis sabe o que ele fêiz?
Foi atrais do noivo?
Nunca mais ôtra vêiz.
Feiz foi ajuntá os dois
Pra mode eles assussegá
Foi uma locura,
Nóis num pode negá.
Mais o cabra da muléstia
Só eu sei o quê que virô
Contô essa história
Fingindo sê narradô.
No finar desse causo
Nem todos ficô feliz
Coitado do Abelardo
Num teve o finar qui quis.

 

 

(Cyntia Cybelle Pinheiro)

Escrito em 1996.

 

 

 

 

 

 

 

 

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