Cyntia Pinheiro (em catarse)
Há tempos não me levanto a noite
apenas para escrever. Hoje nem me deitei, um desconforto grande me doía
fisicamente o coração, eu precisava expressar.
Todos os dias convivo com mais de
uma centena de pessoas no plano físico e milhares no plano virtual. Nessa
perspectiva é absolutamente aceitável lidar com opiniões diversificadas sobre
todo e qualquer assunto, até mesmo política, esporte e religião, assuntos esses
considerados indiscutíveis.
Ultimamente, de modo especial,
tenho lidado com pensamentos bastante contraditórios em relação às muitas
religiões. Hoje, com certa perplexidade, me vi diante de duas posições
extremadas e totalmente desconfortáveis, a fé cega e o completo ateísmo. Ambos
os temas me desconcertaram a ponto de gerar uma angústia e um incontrolável
desejo de me expressar, pois não sou do tipo que guarda as coisas, sou do tipo
que se livra das dores e dos problemas, não quero somatizar, sobretudo as
opiniões alheias.
Primeiro ponto a esclarecer, não
carrego bandeira religiosa, já estive em muitos lugares, aprendi a respeitar as
diferenças. E essa falta de respeito é que me dói. Para exemplificar, me adoece
ver gente negra sendo maltratada sem pleno século XXI, como também me
entristece necessitar de cuidados para me referir à pessoa negra, como se
chamar de “negão” fosse uma ofensa, como se dizer “aquela moça negra” fosse uma
crueldade. Não gosto de ter que dizer “a moreninha”, o rapaz “moreno”. É negro,
pronto e acabou. Sem melindres, sem problemas, sem neuras!
Devemos aceitar todas as
riquíssimas contribuições, sobretudo musicais, que os africanos nos legaram,
pelo ritmo que lhes é peculiar e de onde vem o samba, o maracatu, o “negro
spiritual”, o jazz, o soul, dentre outros belíssimos estilos. Por que não
podemos aceitar que TODOS somos negões? Miscigenados, porém paridos da mesma
cultura africana de onde vieram os escravos...
E a religiosidade negra não deve
ser para nós motivo de repulsa. Todos somos
gente e cada pessoa tem o direito de exercer a sua crença e a sua fé
como lhe aprouver. Enquanto a fé do outro afetar a minha fé, não há que se falar
em Estado Laico, mas em Estado Hipócrita.
Ser ateu também
é um direito do ser. Direito de ser e de não ser parte. Liberdade de escolha,
somente. E o ateísmo também é digno de respeito, já tive conversas extremamente
proveitosas e inteligentes com pessoas declaradamente ateias, cuja conduta
social é a melhor possível, irrepreensíveis no modo de vida. O que não aceito e
jamais vou aceitar, seja de qual lado for, é a intolerância.
Não importa
qual seja o lado, se você acredita em Deus, Jesus, Buda, Maria, Kardek, Maomé,
Sheeva, Ganesh, ou se prefere o niilismo. Se segue o Alcorão, a Bíblia, o Evangelho
segundo o espiritismo, o Mahabarata, Ramayana, Vedas, Torá, Cabala, ou prefere
Nietzche, pouco importa. Se você é
católico, protestante, wiccan, judeu, xintoísta, hindu, muçulmano, islamista,
kardecista, budista, ou se é ateu. Tanto faz!!!! Tanto faz mesmo!!! Conviva em
paz, porque fundamentalismos destroem o mundo!
Meu doeu ouvir
de alguém algo do tipo “quem não crê já está condenado ao inferno”, mas também
me doeu ler na internet que quem acredita em Deus é” idiota alienado” (pegando
a frase mais cortês que havia na página)!
Tanta certeza,
tanta convicção. Quem está certo, afinal? Um destino eu garanto que todos
temos, o túmulo. Daí por diante só temos fé, ou a falta dela.
E enquanto
pessoas que professam alguma fé continuarem atacando a fé alheia ou sua
ausência, enquanto algum homem “branco” continuar se achando superior ao negro,
enquanto o ateu se achar no direito de fazer charge, estatueta, comentários desrespeitosos
quanto à crença dos outros, enquanto existir fundamentalismos, certezas
absolutas e irrefutáveis, todos seremos algozes e vítimas das nossas próprias
vaidades.
Tem mais,
enquanto as maiorias continuarem a oprimir as minorias e enquanto as minorias
tentarem conquistar espaço agredindo a maioria, já era! Isso nunca vai dar
certo.
Esse mundo já
acabou! Para mim, é game over!